bem-estar

Quem não conhece alguém que tenha passado por alguma situação crítica na vida e um tempo depois ficou doente. Esta relação entre situações negativas e saúde/doença já é empiricamente estabelecida.

Por sua vez, o bem-estar psicológico está relacionado com a saúde física e a longevidade. Apesar desta associação ser conhecida já há alguns anos por meio de pesquisas epidemiológicas de observação, pouco se sabia sobre os mecanismos envolvidos que levam uma sensação de bem-estar produzir efeitos benéficos à saúde.

Alguns destes mecanismos começam agora a ser esclarecidos. Resultados de uma pesquisa publicada online no último dia 29 de julho, na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences, demonstram que o bem-estar psicológico afeta genes em células do sistema imune que regulam processos inflamatórios e de síntese de anticorpos. Processos estes fundamentais para o controle das defesas do organismo contra agentes agressores (vírus e bactérias por exemplo).

Estudos prévios já tinham demonstrado que condições adversas crônicas (como estresse e insegurança quanto ao futuro) afetam negativamente estes genes. Neste novo trabalho o efeito do bem-estar psicológico sobre estes genes foi testado em 84 indivíduos saudáveis com idades de 35 a 64 anos. Mais do que isso, os pesquisadores dividiram os indivíduos em dois grupos, fazendo distinção entre dois tipos de bem-estar de origens diferentes e que foram classificados como hedônico ou eudaimônico. A avaliação foi feita por meio de respostas a questionários validados.

Estas palavras pouco conhecidas significam o seguinte: – Hedonismo é o bem estar produzido pelo prazer – termo originado de uma corrente filosófica grega que postulava ser a conquista do prazer o maior bem a ser alcançado pelo ser humano. Representa as experiências afetivas positivas produzidas pelo prazer individual. Eudaimonismo é o bem estar produzido pela realização de atos éticos e benevolentes – termo também oriundo da filosofia grega que postulava que o verdadeiro bem-estar provinha da prática de atos com um sentido mais profundo e com propósitos nobres, que vão além da simples gratificação pessoal.

Esta explicação toda não teria tanta importância se os resultados não tivessem sido tão surpreendentes. Ambos os grupos apresentaram altos níveis de sensação de emoções positivas, inversamente relacionadas com sintomas de depressão. Porém, os efeitos sobre os genes foram opostos. Os indivíduos com bem-estar eudaimônico (atos éticos e benevolentes) tiveram um perfil de regulação gênica que favorece as defesas do organismo, enquanto os do grupo hedônico (bem-estar por gratificação pessoal) apresentaram um aumento na expressão de genes pró-inflamatórios e redução nos reguladores da síntese de anticorpos, perfil este que é prejudicial às defesas do organismo.

Estes resultados são importantes na medida em que apresentam mecanismos moleculares objetivos sendo influenciados por sensações psicológicas subjetivas. No entanto, deve ser levado em conta que não existem seres humanos exclusivamente hedônicos ou exclusivamente eudaimônicos. Além disso, há uma interação entre estes padrões, com uma influência recíproca. O que pode haver é uma predominância de um padrão sobre outro, com consequências moleculares que podem afetar a saúde.

Disto tudo fica a sensação de que, à medida que o conhecimento científico avança, mais se percebe a complexidade da natureza e que as interações entre o meio e o indivíduo são mais profundas do que se poderia imaginar.